Literatura

A inteligência artificial e seus riscos éticos

A inteligência artificial e seus riscos éticos

Arnaldo Niskier

Eleita com 24 votos para ocupar a cadeira nº 9 da Academia Brasileira de Letras, a historiadora Lilia Moritz Schwarcz, antes mesmo de tomar posse, já recebeu a primeira grande incumbência: atualizar a bibliografia de Machado de Assis.

Terá a ajuda do avatar criado pela ABL, com a colaboração da revolucionária inteligência artificial, hoje presente nos mais avançados centros científicos e tecnológicos do mundo. O Machado do século 21 tem uma enorme vantagem: está à disposição do público, podendo responder a questões levantadas pelos seus admiradores.

Estamos espantados com a velocidade com que a tecnologia se espalhou pelo mundo. Mas a OpenAI, a empresa do ChatGPT, já tem sete anos. É vital se apaixonar pelo problema, não pela solução. Hoje, há falta de profissionais qualificados para determinadas atividades. Faltam engenheiros e até já se pensa em importar engenheiros indianos. Ganharíamos uma extraordinária transferência de conhecimentos.

O próximo grande sucesso virá do agro. Otimizar um sistema de irrigação, de fertilização ou o uso de produtos químicos graças a ferramentas de agricultura digital pode representar o futuro. É o caminho a seguir —com os cuidados de evitar fraudes autorais. Não se pode citar pensamentos alheios sem o devido crédito. Se você repete coisas que já foram ditas, certamente não está contribuindo para o avanço da ciência.

Relatos de plágio remontam a Antiguidade, como aconteceu inclusive com o clássico "Os Lusíadas", que teria se baseado em "Eneida". Hoje, o ChatGPT cria novos conteúdos a partir de informações de origem humana. Copia-se para economizar tempo, mas isso é desonesto.

É preciso utilizar de forma correta o avanço da inteligência artificial generativa. Como faz a Nvidia, quarta empresa mais valiosa do mundo (US$ 2 trilhões), vivendo a época de uma "bolha ponto.com".

Com uma relativa fidelidade, a Academia Brasileira de Letras recriou a figura de Machado de Assis, com voz e tudo. Tornou possível interagir com o "Bruxo do Cosme Velho", permitindo que o público dialogasse até mesmo sobre a controvertida questão da traição de Capitu e da negritude do escritor. O seu avatar deu bons conselhos aos que visitam a versão do escritor, no centro do Rio de Janeiro. É o resultado das maravilhas produzidas pela inteligência artificial.

Para criar um avatar de Machado de Assis, a Academia Brasileira de Letras promoveu estudos sobre as obras do autor e sobre ele. A versão do autor foi criada com inteligência artificial e diz que agiria na internet com ponderação e elegância. Sofreu com a demolição da sua casa no Cosme Velho e entrou na discussão sobre a hipotética traição de Capitu.

O avatar dá um conselho aos jovens: "Busquem sempre o conhecimento. Encorajaria os jovens a buscar a educação com fervor. O conhecimento pode abrir portas e criar oportunidades onde antes só havia barreiras".

A volta de Machado ao mundo dos vivos é resultado de uma tecnologia da empresa Euvatar Storyliving, que possibilita a interação de personagens históricos e contemporâneos. O resultado pode ser devidamente apreciado na sede da ABL.

Folha de São Paulo, 04/04/2024

Fonte: https://www.academia.org.br/artigos/inteligencia-artificial-e-seus-riscos-eticos