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FERNADA LAGES
A dor maior é do pai que perdera a filha. E foi brutalmente assassinada, em um prédio em construção, às margens de uma BR, num bairro próximo ao centro de Teresina, só pode ser coisa encomendada. E por gente grande. Gente que tem poder e posse. Pobre e pé rapado, miserável, não se arriscaria a entrar nesse prédio para cometer um crime bárbaro como esse. Nem sequer os vigias deixariam um esmolambado entrar.
O edifício em construção é do Ministério de Público Federal. Os futuros inquilinos respondem pela aplicação correta das leis. São os seus fiscais. Mas por que Fernanda Lages iria se suicidar nesse local? Para chamar a atenção da sociedade? Emprestar maior visibilidade ao caso? Por quê, afinal? E isso interessa depois da morte?
Os assassinos, sim, queriam essa projeção visual de futuro para encobrir o crime, causando comoção social, para trabalhar com tese de suicídio, quando Fernanda não tinha razões nem sequer subjetivas e/ou objetivas, materiais, para se matar. Bonita, esbelta, sem vícios... prendada. Tinha ocupação. Trabalhava. Era estudante de Direito. Tinha futuro. Preparava, aí sim, o seu futuro. Não era vadia. Não era malandra. Tinha amigos e amigas, como todos os jovens na sua idade. Mantinha em Barras, na casa do pai, o seu quarto arrumado, para as visitas ao genitor, ao avô e aos amigos. A família... que não esquecia. Ligava constantemente para o pai. Falava com a mãe. Perguntava pelo irmão, especial. Era assim Fernanda: afetiva e amorosa.
Os assassinos, talvez poderosos, psicopatas, com a mentalidade de que não pagarão pelo crime cometido porque se servem dos vícios elitistas de uma sociedade feudal, ainda concebidos na Casa Grande e na Senzala, num relacionamento de mando patriarcal, e com a noção sedimentada de que nada acontecerá, embora os avanços sociais e do direito assegurem uma punição, diferentemente do que se registrava na escravidão, onde as mortes nem sequer eram anunciadas. Ou anunciadas para mostrar o poder da Casa Grande perante a Senzala. A impunidade.
Esse crime não ficará impune. O Estado, a Policia, têm o dever constitucional de preservar a vida – o maior bem. E uma vida foi brutalmente sacrificada por facínoras que escolheram o prédio do Ministério Público Federal para mata-la. Estariam mandando um recado às instituições, escolhendo uma obra em construção de um órgão federal, logo do MPF, para expandir os seus extintos, e avisar que estão acima da Estado democrático de Direito. Justamente por que são fortes e poderosos. São inatingíveis, portanto.
A dor maior é do pai que perdera a filha. Teve a filha brutalmente assassinada.