Direito

O Direito de Nascer

O direito de nascer, antes um direito reconhecido por todos os Estados e nações, sofre agora de uma crise mundial. E, pasmem, diante de um quadro internacional favorável aos direitos humanos. Realmente os tempos mudaram. Os meios de comunicação adotaram a postura contrária, a sociedade banalizou o aborto e nesse ínterim parece que a defesa da vida virou piada. Mas caríssimos leitores, a verdade é outra. A defesa dos embriões e nascituros é possível e com base no ordenamento jurídico nacional e internacional.

A vida humana começa com a concepção, conforme a teoria mais aceita pelos cientistas. As correntes contrárias que afastam o momento da vida humana desse primeiro marco deixam de considerar três aspectos fundamentais do desenvolvimento do ser humano embrionário: que o processo de formação é contínuo, gradual e coordenado.

A partir da concepção o próprio embrião é o motor do seu desenvolvimento vital, com a coordenada multiplicação de suas células e a gradual formação do complexo corpo humano. Da concepção até a morte é o mesmo individuo, com uma carga genética irrepetível, que se desenvolve e fenece, denotando o ser pessoal. A vida do novo ser começa a partir desse momento. O Dr. William A. Liley, considerado “O Pai da Fetologia”, verificou em suas pesquisas os seguintes dados: “O novo indivíduo comanda o seu ambiente e seu destino com tenacidade de propósito, implantando-se na parede esponjosa do útero e numa demonstração de vigor fisiológico interrompe a menstruação da mãe.”[1].

Ora, a todas as pessoas, em qualquer fase de seu desenvolvimento, deve ser-lhe reconhecido o direito inviolável à vida, o primeiro e mais fundamental dos direitos humanos. Este direito é base do próprio Estado e exige um dever de proteção em face de todos os outros seres humanos e do próprio ser humano. A vida é um dom que não pertence à pessoa, mas lhe é dado para desenvolver as suas capacidades. Desse modo, o direito à vida é também um dever à vida. Esse valor incomensurável da pessoa humana não se pode medir por critérios meramente econômicos, sociais ou jurídicos. O Estado de Direito estaria comprometido se instituída a lei do mais forte e a lógica do utilitarismo.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos reconhece o direito à vida. A Convenção dos Direitos das Crianças, também, pois no seu texto a vida da criança deve ser defendida antes e depois do nascimento. A Convenção dos Direitos Humanos de São José da Costa Rica estabelece que a personalidade jurídica começa na concepção. Tais convenções sobre direitos humanos possuem, em nosso ordenamento jurídico, o status de supralegalidade, isto é, estão abaixo somente da Constituição, conforme jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal. No mesmo sentido advoga o constitucionalista português Jorge Miranda,

“O caráter insubstituível de todo o ser humano, antes e depois do nascimento, o sentido ético e não apenas histórico que possui a vida humana, a sua inviolabilidade proclamada sem limites na Constituição, na Declaração Universal dos Direitos do Homem e no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (que proíbe a execução de mulheres grávidas), o abalo que representaria nos fundamentos da sociedade qualquer ruptura ao princípio da inviolabilidade, sobretudo quando a violação parte de quem é mais responsável por essa vida, a demissão de solidariedade que isso implicaria, tudo são motivos que me levam a rejeitar qualquer medida legislativa que envolva a legalização do aborto.[2]

E a Constituição Federal Brasileira também garante o direito inviolável à vida (art. 5º, caput) e, especificamente, no art. 227, determina de forma peremptória a prioridade absoluta do direito à vida das crianças, em conformidade com a Convenção dos Direitos da Criança. O próprio Estatuto da Criança e dos Adolescentes - ECA prescreve que o Estado deve promover políticas que promovam o nascimento, isto é, reconhece o embrião como um ser humano e define criança como a pessoa humana em desenvolvimento até doze anos de idade. Ora, os embriões nada mais são do que crianças em desenvolvimento e, portanto, estão protegidos pelo ECA e pelo art. 227 da Constituição Federal.

Dessa forma, o aborto e as pesquisas com células-tronco embrionárias são atentados cruéis a crianças indefesas e compete aos juristas desse país restabelecer a justiça, garantindo o direito fundamental à vida a todos os brasileiros sem distinção de qualquer espécie (art. 3º, Inciso VI, da CF/88).

Leslei Lester dos Anjos Magalhães

Advogado da União, Bacharel em Direito pela Unb. Mestre em Direito Constitucional pelo IDP e autor do livro O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Direito à Vida. São Paulo : Editora Saraiva, 2012.

[1] Apud A vida dos direitos humanos: bioética médica e jurídica. Jacques de Camargo Penteado. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris, 1999, p. 25

[2] MIRANDA, Jorge. Constituição e Cidadania. p. 274.