O poema de Carlos Nejar aos gaúchos
ANTIELEGIA À ENCHENTE
CARLOS NEJAR
Amo a água maternal,
água de me beber o sonho,
ou de ir-me purificando
na chama da luz.
E banha o tempo.
Amo a vegetação
da água, quando
a natureza se acende
no fulgor dos animais.
Ou a chuva que, em ervas,
canta e o sol na água nua,
como mulher que, de amor,
se apura.
Mas chuva, se excessiva,
mata, inunda casas, estronda
cargas de velhas nuvens,
afoga e é como as enchentes
roem a sombra de meu povo,
em tambor bate a fome.
E o desastre não socorre
a imberbe vida.
E vejo ruas, praças invadidas,
com água que nos engole,
água de perversa índole,
ferina, desatenta.
E sei que nosso pampa
na peleja, resiste.
Erguemos a cabeça
e a água não derruba
o povo. Não, a água
não. O povo é mais
que o rio, a enchente.
O povo é força
que brota na semente.
E árvore de gerações
faz a floresta,
que, de crescer,
não cessa.
Fonte: https://www.academia.org.br/noticias/o-poema-de-carlos-nejar-aos-gauchos